Julian Assange conquistou uma pequena-grande vitória. Mas a luta continua e pode
ser longa.
Nesta segunda-feira, 20 de maio, dois juízes no Reino Unido permitiram finalmente que Julian Assange possa apelar à mais alta corte britânica o seu caso de extradição. Os juízes não tinham aceito a maioria dos argumentos da equipe de defesa de Assange, mas permitiram a apelação por não confiarem nas garantias exigidas que foram dadas pelos EUA:
1. Promessa de que se Assange fosse extraditado, ele não seria acusado de novos crimes cujas penas pudessem culminar em pena de morte, nem colocado em regime de ainda maior isolamento.
2. Assange poderia recorrer a primeira emenda da Constituição dos EUA (direito de liberdade de imprensa e de expressão – que é um direito fundamental).
3. Assange não seria vítima de preconceito por não ser um cidadão americano e, portanto, receberia o mesmo tratamento dado aos cidadãos dos EUA num processo por espionagem.
1. Como a corte que acusa Assange de cometer 18 crimes sob a lei de espionagem é a corte do estado da Virgínia (onde fica a sede da CIA), chamada de “corte de espionagem” (onde 10 entre 10 julgados são condenados); e as acusações montam uma condenação de 175 anos de prisão (na prática, pior que pena de morte, é morte por tortura para além do tempo de vida humana).
2. Como a acusação dos EUA argumentou que a primeira emenda seria um direito civil (o que é MENTIRA). Assange “poderia recorrer à primeira emenda em sua defesa”, mas não ter como certo esse direito concedido.
3. Assange, um cidadão australiano, que praticou atividades fora da jurisdição dos EUA, tem sido tratado pela acusação no processo como pessoa com as obrigações de cidadão dos EUA (não revelar os segredos de “segurança nacional”), mas sem os direitos de cidadão (primeira emenda). Na prática, ele é discriminado já no processo de extradição por ser um estrangeiro.
A maior vitória legal de Assange até agora, mas com custos:
Em julgamento na mais alta corte, Assange poderá argumentar todo o seu caso que consiste em direito de imprensa e de livre expressão, a natureza das revelações do WikiLeaks que são a base da acusação de espionagem (os crimes contra a humanidade praticados pelo EUA), a perseguição praticada pelo governo dos EUA em conluio com outros países para destruir Assange e WikiLeaks.
Não se deve esquecer que tanto estes 2 juízes que deram esta vitória a Assange estão no bolso do governo dos EUA como todos os outros juízes que vem decidindo a vida de Assange desde 2019.
É razoável entender que a decisão favorável para Assange (SIM uma GRANDE vitória) foi uma decisão política, como todas as outras, mas é uma vitória com pouco tempo de validade. E é também uma conveniência para os EUA.
Hoje Assange se tornaria um prisioneiro inconveniente nos Estados Unidos.
Uma corte inglesa afirmar (depois de anos de conluio com EUA) que agora não confia nas garantias dadas pelos promotores dos EUA é ridículo. Se as cortes inglesas estivessem comprometidas em fazer justiça não teriam permitido que este processo existisse desde 2019, e não permitiria que a farsa do “caso sueco” existisse por 9 anos, situação que foi definida pela ONU como “detenção arbitrária”.
Como afirmou a jornalista e advogada Sara Vivacqua: a corte britânica está limpando a própria cara, dando um show para inglês ver, ao permitir que Assange recorra à corte máxima de apelação.
O judiciário inglês está dando ao súdito desavisado do rei Charles III (o de retrato sangrento) uma performance de justiça, “se fazendo de difícil”. E também dando um refresco para Joe “genocida” Biden, que não quer mais um problema político complicando ainda mais sua campanha há poucos meses das eleições presidenciais.
Um jornalista que revelou os crimes de guerra dos EUA no Oriente Médio ser julgado nos EUA por espionagem agora colocaria ainda mais fogo no país em que estudantes e professores universitários estão protestando contra a cumplicidade de seu país com Israel para cometer genocídio na Palestina ocupada (onde jornalistas, médicos e funcionários da ONU são assassinados por denunciar os crimes contra a humanidade praticados pelo exército de Israel).
O caso Assange é facilmente defensável como “delito de opinião”, como frisou o professor de Relações Internacionais Gilberto Maringoni; o que coloca Assange na categoria de “prisioneiro de consciência”, uma coisa que a imprensa corporativa no Ocidente afirma que acontece apenas nos países que não são aliados dos EUA.
A Austrália natal de Assange, e aliada militar de EUA e Reino Unido, tem grande poder de barganhar pela soltura de seu cidadão: a sua posição geográfica próxima da China. A questão é saber se Anthony Albanese está mesmo pressionando Biden ou apenas fazendo cena para seus cidadãos que querem Assange livre e de volta à pátria.
Processo arbitrário de ritmo arbitrário. Tempo de pressionar com mais força.
O processo de extradição de Assange não segue o ritmo protocolar de justiça. Segue o ritmo das eleições presidenciais dos EUA.
Trump, após orquestrar a prisão de Assange em 2019, afirmou que talvez o libertasse depois das eleições de 2020 (se ele fosse reeleito). Ainda presidente, após perder a reeleição, Trump libertou apenas criminosos, incluindo os criminosos de guerra da empresa Blackwater condenados por um massacre no Iraque.
Biden, após perseguir Assange no período Obama, disse que está considerando desistir da extradição, agora que está em período eleitoral, e depois que ele teve 4 anos para dar fim a esta perseguição.
Julian Assange foi colocado em espera para ter um novo julgamento, provável depois das eleições dos EUA. Aí, talvez, já não exista mais Assange para ser libertado. Nils Melzer, o Relator Especial da ONU sobre Tortura, depois de visitar Julian, disse que ele estava sendo submetido a uma “execução em câmera lenta”.
A estratégia do governo dos EUA sempre foi massacrar Assange pouco a pouco: causar uma morte “natural” ou levá-lo ao suicídio. Um julgamento em corte nos EUA é uma questão de vingança da CIA, não do governo.
A preocupação do governo sempre foi evitar que a discussão sobre liberdade de imprensa alcance o horário nobre da TV americana. Se o Partido Democrata é bem mais competente em fazer guerras imperiais, o Partido Republicano sempre vestiu a carapuça de vilão com mais tranquilidade.
Ganhando (improvável) ou perdendo Biden, o que interessa é evitar que o Partido Democrata fique com a fama de receber e condenar o jornalista que denunciou os crimes dos EUA pelo mundo afora.
Ao Reino Unido o que interessa é manter a aliança com os EUA, mas salvando a imagem de país democrático, o país da Magna Carta, enquanto segue criando leis que a aproximam cada vez mais da Alemanha pós 1933.
Portanto, cabe a todos envolvidos na luta pela libertação de Assange acirrar a campanha para tornar insuportável a pressão para sua libertação imediata. Não se deve esperar por um novo julgamento, especialmente porque Assange está com a saúde arruinada.
Nas palavras do jornalista Chris Hedges, especialista em cobrir guerras e amigo de Assange:
“Devemos libertar Julian. Devemos mantê-lo fora das mãos do governo dos EUA. Considerando tudo o que ele fez por nós, devemos-lhe uma luta implacável.
Se não houver liberdade de expressão para Julian, não haverá liberdade de expressão para nós.”
Pela Campanha Pela Libertação de Julian Assange
A Folha de São Paulo é um veículo jornalístico? Noam Chomsky escreveu que “A maneira inteligente de manter as pessoas passivas e obedientes é limitar estritamente o espectro de opiniões aceitáveis, mas permitir um debate muito animado dentro desse espectro”. Veículos de imprensa como Folha de São Paulo fizeram desta limitação de opiniões aceitáveis o seu ofício. Este jornal promoveu um pretenso debate “Julian Assange deve ser extraditado para os Estados Unidos?” dias após a finalização de audiências em corte de Londres do talvez último recurso de Assange para não ser extraditado. O que foi apresentado não foi nem mesmo formalmente um debate. O artigo pelo “SIM Assange deve ser extraditado” não se comunica com o artigo pelo NÃO, pois ambos artigos foram publicados no mesmo dia e na mesma hora e não houve sequência à exposição das duas opiniões opostas. Debate real implicaria réplicas às argumentações e um aprofundamento (mesmo que mínimo) do as...
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